Você acorda e veste o uniforme de sempre: o mesmo crachá, a mesma rotina, a mesma maneira de responder “tudo bem” quando alguém pergunta. Só que, no fundo, não está mais tudo bem. O trabalho que antes dava orgulho agora pesa como um fardo. A relação que já foi lugar de aconchego hoje parece um contrato burocrático. Até a casa, com os móveis que você mesmo escolheu, já não transmite lar.
É como calçar um sapato que foi feito para você anos atrás e agora aperta. E aqui vem a parte incômoda: não é o mundo que mudou tanto assim, foi você. Os sentidos que davam sustentação se esgotaram. E quando isso acontece, não há manual que segure. Você se vê diante daquilo que Sartre já chamava de condenação: ter que escolher, reinventar, assumir a liberdade de criar-se de novo.
O vazio que aparece não é uma falha sua, é o anúncio de que a vida antiga morreu. E a pergunta é direta: você vai continuar tentando caber em algo que já não comporta quem você se tornou, ou vai aceitar o risco de nascer outra vez?
Aline Andrade
Psicóloga Clínica




